terça-feira, 30 de março de 2010

Uma l�grima por Armando Nogueira

Um craque - na concep��o de todos os que vivem o jornalismo; um t�cnico - na constru��o do ide�rio daqueles que amam o futebol; um maestro - que "tocava"as palavras, extraindo delas n�o s� sentido, mas cor e emo��o e lirismo: este o Armando Nogueira que conheci.

Obviamente - e infelizmente - n�o jamais o encontrei no plano f�sico, portanto dele n�o posso falar como colega, comandado ou amigo; mas sinto como se o tivesse, embalado ao longo de muitos anos por suas palavras m�gicas, combinadas em textos na imprensa escrita ou eletronica, declamados (como poesia que s�o) por tantas e t�o belas vozes, como a sua pr�pria. Conheci-o tamb�m atrav�s da televis�o, por via indireta (atrav�s de conceitos inseridos desde sempre na alma de n�s brasileiros) ou direta, em seus programas na tev� a cabo ou nas - j� h� algum tempo raras - entrevistas.

Cultivei com ele aquele elo que nos faz mais que admiradores, entusiastas, ciente o tempo todo que daqueles olhos calmos, daquela finesse incontest�vel, brotavam fa�scas de genialidade e inspira��o.

Por isso chorei, silente, no Jornal Nacional de ontem, e repeti a dose no Jornal da Globo, como quem perde um amigo querido. N�o o choro da tristeza ou do desespero, incab�veis, mas o choro discreto e incont�vel de quem testemunha um adeus de algu�m que marcou sua trajet�ria com os signos da lucidez racional e da imagina��o afetiva, de maneira incontest�vel, rica e inesquec�vel.

A um mestre cantado por tantos, juntei minha l�grima em ova��o, como um coro da torcida no Maracan�, que ontem velou calado seu �ltimo adeus.

sexta-feira, 19 de março de 2010

N�s n�o amamos Brigitte Bradot

Cresci ouvindo falar daquela mulher lind�ssima, lour�ssima, talentos�ssima, t�o famosa quanto os Beatles ou Marilyn Monroe, que encantara o mundo por mais que uma gera��o e se retirara no auge, tornando-se uma reclusa esquisitona que propaga(va) aos quatro ventos preferir os animais aos seres humanos.

"Como � que pode, largar tudo para viver uma vida assim, quase mon�stica, entregando-se a uma loucura dessas, gatinhos e c�ezinhos, cavalos e beb�s-foca... Muito louca, isso sim...", diziam meus pais e todos aqueles que antes a veneravam.

Depois conheci B�zios, no estado do Rio, e toda a mitologia reunida ao redor e sobre sua visita inesquec�vel ao Brasil em 1965, da Rua das Pedras �s praias (n�o mais, h� tempos) quase virgens.

Mas foi s� bem mais tarde, nas madrugadas do extinto Telecine Classic, que pude apreciar mais a fundo sua beleza loura, sua intensidade e seu talento. Nem parecia que ela permanecia viva, enclausurada na velha casa que escondeu e escancarou a um s� tempo, ao mundo e a quem interessasse, sua lenta degenera��o em decrepitude. (Re) Descobri BB viva, ao assistir um punhado de filmes e descobrir que sentia por ela o mesmo tes�o de f� que me une indelevelmente a umas poucas outras estrelas como Liz Taylor e Audrey Hepburn - que envelheceram de forma t�o dessemelhante.

No que chovo no molhado, uma vez mais: estrelas n�o morrem, ainda que tentem faz�-lo em vida, com suas opini�es estridentes e idiossincrasias pouco compreendidas, e assim renascem a cada gesto, os de estreia tanto quanto os longos feneceres, como se suas luzes astrais teimassem em brilhar vindas l� de cima, para descer lenta e calmamente � Terra ao longo dos s�culos.

Por isso reencontr�-la agora, meio de surpresa, atrav�s do document�rio de Benjamin Roussel "Brigitte criou Bardot", de 2007, foi t�o impactante. V�-la defender seus pontos de vista com clareza, intelig�ncia e verve, vestida do corpo sovado pela velhice que quase a torna mais uma vez bonita, em seu (j� n�o t�o) novo papel de anci�, chega a comover. Sua luta a colocou � frente de seu tempo, antecipando tend�ncias da moda como o abandono (parcial) do uso de peles naturais pelos avatares da moda, pressagiando temas marcantes do fimde s�culo como o ambientalismo, instigando desde h� quase quarenta anos a discuss�o t�o moderna a respeito da crueldade de abatedouros e que tais.

"O ser humano � um horror, o que n�s fazemos..."; "sinto-me mais � vontade entre os animais que entre os seres humanos"; "fiz o que fiz para tentar sobreviver em um mundo que me � hostil" s�o algumas das frases (feitas) pela atriz ao longo de uma hora de entrevistas e memorabilia, pela primeira vez -pelo menos para mim - colocadas em perspectiva,dentro de um contexto que se aproxima do que podemos imaginar seja a vis�o dela, com respeito e sem bl�-bl�-bl�.

La Bardot vive, aninhada no desejo - e mais uma vez digo "quase" - inconfess�vel que sua imagem adolescente provoca em n�s nos velhos filmes de sua �poca, e - repito, pelo menos para mim - na compreens�o recent�ssima da import�ncia de sua trajet�ria.

O mundo n�o a merece, e na cabe�a ecoa Gaisbourg, com a vers�o (original) que contrap�e t�o apropriadamente ao "Je t'aime" (te amo), o "moi non plus" (nem eu).

terça-feira, 9 de março de 2010

A cachorra cheira-bunda II

Oswaldo se mudou recentemente para o outro lado da cidade: vendeu um terreno e comprou uma casa antiga, com terreno legal cheio de �rvores frut�feras, antiga casa de padres onde tudo que se planta d�, que nem o nosso Brasil.

De vez em quando volta � antiga moradia, que est� arrumando para alugar, e (re)encontra a cheira-bunda. �, a cadela que o seguia por toda parte at� uns dias atr�s...

Junto com ela, que � preta como piche, agora vive um machinho louro, vira-lata tamb�m, no terreno vago em frente � casa (velha).

Pois n�o � que a cheira-bunda achou o caminho, e hoje apareceu do outro lado da cidade, sabe-se l� como? Depois a gente ouve falar de hist�rias como esta e n�o acredita que � poss�vel, mas hoje a vi com meus pr�prios olhos.

Chegou toda suja de �leo diesel, chorando e ganindo como se pedisse ajuda ao amigo, que prontamente deu-lhe um banho, casa e comida. O percurso? Coisa de uns quatro quil�metros, no m�nimo.

"E a�, vai ficar com ela, Oswaldo?"

"P�, bicho, e tenho outra coisa pra fazer? Depois dela percorrer um caminho desses?"

Pois �, Oswaldo, ou o faro dela � bom demais, ou o cheiro � muito forte...