terça-feira, 6 de março de 2012

A Guerra dos Tronos OU O Animal Ancestral

A Guerra dos Corvos ou

O Animal Ancestral

O ser humano, j� foi demonstrado cientificamente, tende a reconhecer o (j�) conhecido - se voc� me desculpa o duplo pleonasmo; enxerga no semelhante a si a beleza, da mesma forma com que pressente o medo no que lhe eh simplesmente estranho ou diferente.

A teoria das faces protot�picas, longe de armar o preconceito, o explica: nosso c�rebro armazena informa��es relativas � tridimensionalidade dos rostos como o faz quando associa a forma e a fun��o de objetos, estabelecendo conex�es muito mais abrangentes do que pensamos. A maioria das pessoas tende a apreciar semblantes de pessoas cujas caracter�sticas se aproximam da media em termos de volume e propor��o: narizes nem chatos nem largos ou aduncos demais; queixos vis�veis, mas n�o protuberantes; orelhas de elfo, se estes existissem, fariam par as de abano; l�bios se poss�vel desenhados, nem finos como os do Batman, nem grossos como os de la Jolie.

(obviamente nem sempre assim)

Somos bastante conservadores quanto a nossas prefer�ncias est�ticas. Sabe por que os pentes de antigamente tinham aquela esp�cie de ranhura imediatamente acima dos dentes? Lembra? Estavam quase sempre l�, fosse o pente de osso, de madeira entalhada ou marfim, mesmo em alguns j� feitos de pl�stico, bem recentes... Fun��o? Nenhuma - a n�o ser nos fazer lembrar um tempo em que pentes eram feitos de verdadeiros dentes ou garras de animais, amarrados com pedrinhas, manufaturados com a paci�ncia infinita da necessidade.

Est�tica, a ci�ncia, esta cheia desses exemplos nos quais a forma sobrevive a fun��o, subvertendo o esperado, sugerindo a verdadeira extens�o do poder das imagens em nosso subconsciente. Se voc� acha que n�o, que tudo isso eh for�a��o de barra de filosofo maluco, preste aten��o em nossos ve�culos mais modernos: para que servem, ainda mais estilizados, os p�ra-lamas que insistem em reaparecer?

A ind�stria e sua filha, a propaganda, sabem de tudo isto h� tempos: decalcam em nossa mem�ria eventos afetivos que consolidam marcas, produtos, servi�os. Os pol�ticos tamb�m o fazem, pelo menos quando sabem representar (bem) seu papel. Na Pintura deram at� nome: Impressionismo, porque n�o eh exatamente a forma que "fica", eh a impress�o, a mem�ria da forma, origem de todas as madeleines.

Lembro que h� duas ou tr�s d�cadas o frisson era pelos ferorm�nios, ou feromonas, orgi�sticos agentes da simpatia e da libido a desencadear antipatias gratuitas e paix�es fulminantes. Somos escravos do cheiro, diria a d�cada d'O Perfume, livro que alcan�ou a gl�ria antes de ser entendido como a s�tira que eh.

Hoje a onda eh abra�ar "nosso lado sombrio", como quer o Chopra e sua turma em mais uma tentativa de provar que olhar para um el�tron o transforma - o que deve ser verdade, pelo menos do ponto de vista comercial, vez que desde a Teoria da Relatividade uma hip�tese cientifica n�o era al�ada a condi��o de verdade universal Yao rapidamente como o tal Princ�pio da Incerteza (ou n�o merece as mai�sculas?)

Ou negar sua exist�ncia, coisa que fazem os adeptos do tal Segredo, que se pro�bem ate pensamentos obscuros, numa lavagem cerebral auto-infligida; espiritualistas variados que partem do principio que "na natureza" n�o h� bem ou mal; ate crist�os possuidores da �nica verdade que pregam que Cristo n�o apresentava dejetos fisiol�gicos, ou at� mesmo comi ou dormia, sem perceber que negam a Humanidade que o define.

Por isto e mais um tanto sou cada vez mais f� do George R. R. Martin e suas Cr�nicas de Gelo e Fogo, onde a natureza selvagem do ser humano eh dissecada em sua ess�ncia, ao descrever um momento hist�rico (fantasioso, por que n�o?) em que as normas de conduta social ainda estavam se consolidando. Na obra de Martin, o confronto com o animal interior faz surgir das personagens, o melhor (ou n�o), e os faz por isto plenamente reconhec�veis, apesar de selvagens, nossos irm�os. Profundamente humanos em sua �nsia por compreender o mundo que os cerca, perigoso, indecifr�vel e vasto, complexo, estarrecedor... em tempos piores quae os nossos..

Quando nos enredamos em seu mar de narrativas e subitamente nao nos importamos mais com a esquisitice de um universo povoado por lobos gigantes, homens das cavernas ou filhotes de drag�o pode ser que o que reconhece os n�o seja sob a humanidade de tribos e cren�as ancestrais, fundamentadas em outros paradigmas, mas a pr�pria estranheza de nossa gente e nosso mundo.

Reconhecer mais facilmente o que apreciamos pode ser um aspecto essencial da natureza humana, mas n�o significa que n�o conseguimos enxergar o diferente. De maneira an�loga a crian�a rejeita alimentos muito coloridos , �cidos ou pungentes: faz parte de seus mecanismos de defesa contra intoxica��es e venenos.

Com o tempo e a maturidade, podemos chegar a desejar estas experi�ncias, por darem tempero a vida. Do que seriamos capazes se finalmente entend�ssemos mais sobre a nossa pr�pria natureza? Despidos de nossos vieses culturais, talvez ate dos filogen�ticos, seriamos melhores ou piores? Bons? Ou maus?

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